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O Afeganistão, um país sem litoral aninhado no coração da Ásia Central e do Sul, tem servido historicamente como uma ponte crucial entre diversas civilizações.1 Sua localização estratégica lhe conferiu uma importância geopolítica tremenda ao longo dos milênios, tornando-o palco de rotas de invasão e comerciais vitais, como a lendária Rota da Seda e a estratégica Passagem de Khyber.1
Apesar de sua rica tapeçaria histórica e cultural, o Afeganistão é frequentemente percebido no imaginário ocidental como uma terra árida e inóspita, ganhando a reputação de “cemitério de impérios”.4 Compreender a profundidade da história do Afeganistão, a complexidade de sua situação política atual e o potencial de seu futuro requer um estudo aprofundado que abranja suas raízes antigas até os desafios contemporâneos.
Raízes Antigas: A História Pré-Islâmica do Afeganistão
Evidências arqueológicas notáveis sugerem uma presença humana no território do Afeganistão que remonta a pelo menos 50.000 anos.7 As primeiras comunidades agrícolas da região estão entre as mais antigas do mundo, com vestígios de assentamentos datando de cerca de 7.000 anos atrás.7 Artefatos impressionantes, com cerca de 50.000 anos, foram descobertos em cavernas afegãs, e uma intrigante cabeça de pedra, estimada em 22.000 anos, foi desenterrada no sítio de Aq Kupruk.9
Esta longa história de ocupação humana atesta a resiliência e a importância duradoura da região para as primeiras migrações e assentamentos populacionais. A fertilidade de certas áreas do Afeganistão, notavelmente as planícies do norte, desempenhou um papel crucial no florescimento dessas primeiras comunidades agrícolas, fornecendo as condições necessárias para o desenvolvimento da vida sedentária e da produção de alimentos.1
A cultura Helmand floresceu na região por volta de 3300–2350 AEC, deixando para trás sítios arqueológicos significativos como Mundigak.1 Simultaneamente, a civilização Oxus, também conhecida como Complexo Arqueológico Bactria-Margiana (BMAC), prosperou no norte do Afeganistão entre 2200 e 1700 AEC.1 Essas civilizações antigas indicam um desenvolvimento urbano precoce e habilidades notáveis em metalurgia na região, sugerindo um nível de sofisticação que desmente a percepção moderna do Afeganistão como uma terra isolada.
Além disso, acredita-se que o Afeganistão pode ter sido um ponto de origem para a disseminação da Idade do Bronze pelo mundo antigo, dada a antiguidade de seus achados arqueológicos e suas conexões com outras culturas da Idade do Bronze.7
A influência da Civilização do Vale do Indo (IVC) também alcançou o nordeste do Afeganistão, com um sítio importante descoberto ao longo do rio Oxus, em Shortugai.7 Essa conexão precoce demonstra a integração do Afeganistão em redes comerciais e culturais mais amplas já na antiguidade, facilitando a troca de bens e ideias entre as culturas do centro e do sul da Ásia.1 A localização de Shortugai, em particular, sugere o papel crucial do Afeganistão como um elo vital entre essas distintas esferas culturais.
Por volta de 1500-1000 AEC, povos iranianos começaram a se estabelecer na região do Afeganistão.7 Posteriormente, os Medos incorporaram a maior parte do território afegão em seu domínio entre 700 e 550 AEC.1 Este período marca a chegada de grupos étnicos que viriam a formar a base da população moderna do Afeganistão, estabelecendo raízes culturais e linguísticas que perdurariam por milênios.
No século VI AEC, Ciro, o Grande, estabeleceu a autoridade do Império Aquemênida sobre a área. Dario I, seu sucessor, consolidou ainda mais o domínio aquemênida na região através da organização de satrapias, incluindo Aria, Bactria, Arachosia e Gandhara, que abrangiam grande parte do Afeganistão moderno.10
Durante este período, o Zoroastrismo provavelmente era amplamente praticado no Afeganistão, com a crença de que o Avesta, o texto sagrado do Zoroastrismo, pode ter se originado na antiga Ariana, o nome mais antigo conhecido para o Afeganistão.7
A influência persa trouxe uma administração organizada e uma religião que moldou profundamente a cultura da região, deixando um legado que se manifestaria em períodos posteriores da história afegã.
Em 330 AEC, Alexandre, o Grande, da Macedônia invadiu a região após derrotar Dario III da Pérsia. Após a morte de Alexandre, em 323 AEC, o vasto império que ele havia conquistado foi dividido entre seus generais, e a região do Afeganistão passou para o controle do Império Selêucida.7 Por volta de 250 AEC, o Reino Greco-Bactriano emergiu como um estado independente, combinando as culturas grega e local em uma síntese única.8
Cidades como Ai-Khanoum e Bactra floresceram como centros de sofisticada cultura helenística, exibindo teatros gregos, ginásios e arquitetura com colunatas.16 O período helenístico deixou um legado cultural significativo na região, caracterizado pela fusão de influências gregas, iranianas e indianas, particularmente evidente no desenvolvimento da arte greco-budista, que se espalhou pela Ásia.14
O Reino Greco-Bactriano, portanto, representou um importante estado helenístico na Ásia Central, exercendo uma profunda influência cultural, estratégica e militar na região que hoje corresponde ao Afeganistão.16
No século I EC, o Império Kushan, formado pela tribo Yuezhi, ascendeu ao poder e englobou grande parte do Afeganistão, do norte da Índia e da Ásia Central.8 Sob a liderança de Kanishka, o Império Kushan tornou-se um importante centro político e comercial, facilitando o comércio ao longo da Rota da Seda e também se destacando como um grande patrocinador do Budismo.20
Durante este período, a arte greco-budista floresceu na região de Gandhara, combinando elementos da arte helenística com temas budistas.20 O Império Kushan desempenhou um papel crucial na transmissão do Budismo da Índia para a Ásia Central e, posteriormente, para a China.20 O sincretismo religioso e cultural do Império Kushan deixou uma marca duradoura na região, particularmente no desenvolvimento da arte greco-budista, que influenciou as tradições artísticas em toda a Ásia.20
No século III EC, o Império Sassânida persa estabeleceu controle sobre partes do Afeganistão.7 No entanto, no século V EC, uma nova onda de nômades da Ásia Central, os Heftalitas (também conhecidos como Hunos Brancos), tomaram o controle da região. Seu domínio durou até o século VI, quando foram derrotados por uma coalizão de Sassânidas e turcos ocidentais.7 Essas invasões marcaram um período de transição e conflito na história do Afeganistão, com a influência de diferentes povos nômades e impérios moldando a paisagem política e cultural da região.
A Chegada do Islã e os Reinos Medievais
As conquistas muçulmanas do Afeganistão tiveram início no século VII, no contexto da expansão islâmica que se seguiu à queda do Império Sassânida.28 Embora as primeiras incursões árabes tenham resultado na conquista de áreas como o Sistão e o Khorasan, a islamização completa da região foi um processo prolongado, que durou vários séculos. Áreas como Cabul e Zabulistan ofereceram forte resistência à avançada muçulmana inicial.30
No entanto, dinastias posteriores, como os Saffaridas no século IX, desempenharam um papel fundamental na disseminação do Islã por todo o Afeganistão.29 A introdução do Islã transformou profundamente a religião e a cultura da região, embora a conversão tenha sido um processo gradual e, em alguns casos, forçado, com alguns relatos de violência e destruição de locais de culto não islâmicos.33 As conquistas islâmicas, portanto, tiveram um impacto profundo e multifacetado no Afeganistão, transformando seu cenário religioso, estruturas políticas e identidade cultural ao longo de vários séculos.33
Nos séculos IX e X, surgiram diversas dinastias islâmicas locais, incluindo os Tahiridas e os Saffaridas.12 Posteriormente, no século X, os Gaznávidas, uma dinastia de origem turca, ascenderam ao poder e estabeleceram um vasto império que incluía o Afeganistão e se estendia por partes da Índia.10
Mahmud de Ghazni, um dos governantes mais proeminentes dos Gaznávidas, é considerado um dos maiores conquistadores da história do Afeganistão.13 Essas dinastias islâmicas consolidaram o Islã na região e promoveram um período de florescimento cultural e intelectual, com Ghazni se tornando um importante centro de aprendizado no mundo islâmico, rivalizando com Bagdá em importância cultural.31
No século XII, os Gúridas derrubaram o domínio dos Gaznávidas, expandindo seu próprio império e patrocinando ativamente instituições religiosas muçulmanas.10 O Minarete de Jam, uma impressionante estrutura construída durante o reinado dos Gúridas, permanece como um exemplo notável do legado arquitetônico e cultural deste período.31 O Império Gúrida marcou um período de poder afegão e deixou um legado arquitetônico duradouro, demonstrando a ascensão de dinastias locais que exerceram influência significativa na região.
No século XIII, o Afeganistão sofreu a devastadora invasão do Império Mongol sob a liderança de Genghis Khan.10 As campanhas militares mongóis resultaram em grande destruição e perda de vidas em todo o país. Notavelmente, a resistência na região de Bamiyan foi particularmente feroz, culminando na morte de um dos netos de Genghis Khan durante o cerco da cidade em 1221.
Em fúria, os mongóis retaliaram com um massacre da maior parte da população original do vale.4 As invasões mongóis tiveram um impacto profundo e duradouro no Afeganistão, interrompendo o desenvolvimento cultural e social e deixando cicatrizes que levariam séculos para cicatrizar.
No século XIV, Timur, também conhecido como Tamerlão, estabeleceu o Império Timurida, que incluía o Afeganistão em seus vastos domínios.10 Sob o governo dos Timúridas, a cidade de Herat floresceu como um importante centro cultural, tornando-se um foco de aprendizado e atividade artística.31
Os Timúridas reconstruíram muitas das áreas que haviam sido devastadas pelas invasões mongóis, patrocinando as artes, a literatura e as ciências islâmicas. Este período representou um renascimento cultural e artístico na região, com um forte patrocínio que atraiu estudiosos e artistas de toda a Ásia Central.
O Afeganistão Moderno: Do Século XVI ao XXI
Nos séculos XVI e XVII, o território do Afeganistão tornou-se palco de disputas territoriais entre três grandes impérios regionais: o Império Mughal, o Canato de Bukhara e o Império Safávida. A região de Kandahar, em particular, serviu como uma zona de conflito estratégica entre os Mughals e os Safávidas, com o controle da área frequentemente mudando de mãos.4 No entanto, Cabul, localizada na parte oriental do Afeganistão, tornou-se uma importante província do Império Mughal sob o governo de Akbar, demonstrando a complexa dinâmica de poder e influência na região durante este período.10
No início do século XVIII, Mir Wais Hotak liderou uma bem-sucedida revolta afegã contra o domínio do Império Safávida persa, estabelecendo a dinastia Hotak na região de Kandahar.4 Esta revolta marcou um momento crucial na história do Afeganistão, pois contribuiu significativamente para o enfraquecimento e eventual declínio do Império Safávida.4 A ascensão da dinastia Hotak representou uma breve unificação do Afeganistão sob a liderança de uma dinastia afegã, sinalizando o crescente desejo de autonomia e independência das potências estrangeiras.
Em 1747, após o assassinato de Nadir Shah, o poderoso governante persa, Ahmad Shah Durrani, um ex-comandante militar sob o serviço de Nadir Shah, fundou o Império Durrani. Este império é amplamente considerado o precursor do Afeganistão moderno.4 Ahmad Shah Durrani expandiu o controle afegão de Meshed, no oeste, até Kashmir e Delhi, no leste, e do rio Amu Darya, no norte, até o Mar Arábico, no sul.32 Sua liderança e conquistas estabeleceram as bases para o estado afegão que conhecemos hoje, e ele é frequentemente lembrado como o “Pai Fundador do Afeganistão”.35
Durante os séculos XIX e XX, o Afeganistão se viu no meio do chamado “Grande Jogo”, uma intensa rivalidade estratégica e política entre o Império Britânico e o Império Russo pela supremacia na Ásia Central.5 O Afeganistão, devido à sua localização estratégica, tornou-se um estado tampão crucial entre as esferas de influência dos dois impérios.
Este período foi marcado por três guerras anglo-afegãs, que resultaram em tentativas britânicas de exercer controle sobre o Afeganistão e sua política externa.13 A Linha Durand, estabelecida em 1893, definiu a fronteira entre o Afeganistão e a Índia Britânica (que mais tarde se tornou o Paquistão), uma linha que teve consequências duradouras para a região.35 O “Grande Jogo” moldou as fronteiras modernas do Afeganistão e levou a um longo período de interferência estrangeira em seus assuntos internos.
Em 1919, após a Terceira Guerra Anglo-Afegã, Amanullah Khan declarou a independência total do Afeganistão da influência britânica e embarcou em uma ambiciosa série de reformas modernizadoras destinadas a transformar o país.13
Suas políticas incluíram mudanças sociais, educacionais e políticas significativas. No entanto, essas reformas encontraram forte oposição de elementos conservadores dentro da sociedade afegã, e Amanullah Khan foi forçado a abdicar em 1929, mergulhando o país em um período de instabilidade.13 As tentativas de modernização no início do século XX enfrentaram, portanto, uma considerável resistência devido a fatores sociais, religiosos e tribais.
Após um período de instabilidade, Nadir Shah ascendeu ao poder e estabeleceu uma nova dinastia.10 Seu reinado foi seguido pelo de seu filho, Zahir Shah, que ascendeu ao trono em 1933 e governou por 40 anos, um período que trouxe uma relativa estabilidade ao país.10 O longo reinado de Zahir Shah é frequentemente lembrado como uma era de paz e progresso cauteloso antes dos conflitos mais violentos que se seguiriam nas décadas posteriores.
Em 1973, o príncipe Mohammed Daoud Khan, primo do rei Zahir Shah e ex-primeiro-ministro, liderou um golpe militar que derrubou a monarquia e estabeleceu a República do Afeganistão.13 Este evento marcou o fim de um longo período de governo monárquico. No entanto, a estabilidade seria de curta duração. Em abril de 1978, um golpe conhecido como Revolução de Saur, liderado por comunistas apoiados pela União Soviética, resultou no assassinato de Daoud e na ascensão ao poder do Partido Democrático Popular do Afeganistão (PDPA), de orientação marxista-leninista.13
Este golpe e as subsequentes políticas radicais do governo comunista levaram a uma crescente oposição e, finalmente, à Guerra Afegã (1978-1992). Em dezembro de 1979, a União Soviética invadiu o Afeganistão sob o pretexto de apoiar o governo comunista contra a crescente insurgência.13
Esta invasão marcou o início de um longo e sangrento conflito que teria consequências duradouras para o Afeganistão e para a própria União Soviética. A intervenção soviética, portanto, marcou o início de um longo período de conflito e instabilidade no Afeganistão, com consequências devastadoras em termos de vidas perdidas, deslocamento populacional e destruição de infraestrutura.
Os Mujahideen, combatentes da resistência afegã apoiados por vários países, incluindo os Estados Unidos, resistiram ferozmente à ocupação soviética.13 Após uma década de combates intensos e com crescente pressão internacional, a União Soviética retirou suas tropas do Afeganistão em 1989.13
No entanto, a retirada soviética não trouxe paz ao Afeganistão. Em vez disso, a guerra civil entre o governo comunista, agora enfraquecido, e as diversas facções Mujahideen continuou, mergulhando o país em mais anos de conflito.13 A guerra soviético-afegã é frequentemente considerada um dos fatores que contribuíram para a eventual dissolução da União Soviética em 1991, demonstrando o alto custo e as consequências imprevistas da intervenção estrangeira.5
Após a queda do governo comunista em 1992, as diversas facções Mujahideen, que haviam se unido para lutar contra os soviéticos, voltaram-se umas contra as outras em uma amarga luta pelo poder, levando a mais anos de guerra civil e anarquia.13 Foi neste ambiente de caos e instabilidade que o Talibã, uma milícia islâmica fundamentalista, emergiu em meados da década de 1990. Prometendo restaurar a paz e a ordem e implementar uma interpretação estrita da lei islâmica, o Talibã rapidamente ganhou apoio, especialmente entre a população exausta por anos de guerra.13
Em 1996, o Talibã capturou a capital, Cabul, e estabeleceu o Emirado Islâmico do Afeganistão, impondo um regime repressivo baseado em sua interpretação da Sharia.46 Inicialmente, o Talibã ganhou algum apoio por trazer uma medida de estabilidade a um país assolado pela guerra, mas logo impôs um regime brutal e opressor, particularmente contra as mulheres, restringindo severamente seus direitos à educação, ao trabalho e à participação na vida pública.46
Após os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos, que foram orquestrados pela Al-Qaeda, uma organização terrorista que tinha bases no Afeganistão e era protegida pelo Talibã, os EUA lançaram uma intervenção militar no Afeganistão em outubro de 2001.51 O objetivo declarado da intervenção liderada pelos EUA era derrubar o regime do Talibã, desmantelar a Al-Qaeda e impedir que o Afeganistão se tornasse novamente um santuário para terroristas internacionais.
A guerra no Afeganistão se tornou o conflito mais longo da história americana, com as forças da coalizão permanecendo no país por quase duas décadas.5 Em agosto de 2021, após a decisão do presidente dos EUA, Joe Biden, de retirar todas as tropas americanas do Afeganistão, as forças da coalizão completaram sua retirada.51 A intervenção dos EUA, embora inicialmente bem-sucedida em remover o Talibã do poder, levou a uma longa insurgência e a uma instabilidade contínua no país.
Após a retirada das forças dos EUA e de seus aliados internacionais, o Talibã lançou uma rápida ofensiva em todo o Afeganistão e, em questão de semanas, retomou o controle da maior parte do país. Em 15 de agosto de 2021, o Talibã entrou na capital, Cabul, levando ao colapso do governo afegão apoiado pelos EUA e ao restabelecimento do Emirado Islâmico do Afeganistão.47
A situação atual no Afeganistão é marcada por desafios políticos, econômicos e humanitários significativos. O regime do Talibã enfrenta dificuldades em obter reconhecimento internacional, lidar com uma economia em crise e garantir os direitos humanos de todos os afegãos, particularmente mulheres e minorias.56 A retomada do poder pelo Talibã reverteu muitas das reformas sociais e políticas que haviam sido implementadas durante a intervenção dos EUA e levou a uma crise humanitária e de direitos humanos em curso.
Geografia e Meio Ambiente do Afeganistão
O Afeganistão, um país sem litoral localizado na Ásia Central e do Sul, compartilha fronteiras com seis nações: China, Irã, Paquistão, Tajiquistão, Turcomenistão e Uzbequistão.1 Sua posição geográfica estratégica confere-lhe uma importância geopolítica significativa, servindo como uma ponte entre diferentes regiões da Ásia.1
O clima do Afeganistão é continental, variando de árido a semiárido, com invernos rigorosos, onde as temperaturas podem cair para -20°C, e verões quentes, com temperaturas que frequentemente ultrapassam os 30°C e podem chegar a mais de 50°C em algumas áreas.11 A precipitação é geralmente escassa, variando significativamente de região para região, com menos de 150 mm anuais no sudoeste árido e mais de 1000 mm nas áreas montanhosas do nordeste.61
Este clima rigoroso e a escassez de água representam desafios consideráveis para a agricultura e para a vida cotidiana da população. A variação climática e a topografia do país influenciam diretamente a distribuição da população e as atividades econômicas.1
A topografia do Afeganistão é predominantemente montanhosa, com a imponente cordilheira do Hindu Kush dividindo o país de leste a oeste.2 Outras cordilheiras importantes incluem o Koh-i-Baba e o Safed Koh.11 Esta topografia acidentada dificulta a comunicação e o transporte entre as diferentes regiões, contribuindo para a fragmentação étnica e regional que caracteriza o país.1
No que diz respeito à distribuição da terra, as planícies localizadas no norte do Afeganistão são conhecidas por sua fertilidade e são importantes centros agrícolas.11 Em contraste, o planalto situado no sudoeste do país é principalmente árido, compreendendo grandes desertos como o Registan, o Dasht-i-Margo e o Dast-i-Khash.1
O Afeganistão é atravessado por diversos rios importantes, incluindo o Amu Darya (conhecido na antiguidade como Oxus), o Helmand, o Kabul e o Hari Rud.1 A maioria desses rios flui em direção ao sudoeste ou deságua no rio Indo.69 Rios e córregos têm desempenhado um papel vital nas estruturas urbanas e na agricultura da região desde os tempos antigos, fornecendo água para irrigação e sustentando as primeiras civilizações.1
Além de sua localização estratégica e paisagem diversificada, o Afeganistão é rico em recursos minerais, incluindo depósitos significativos de ouro, prata, cobre, ferro, lítio, terras raras, gás natural e petróleo.11 O país também possui abundantes reservas de pedras preciosas e semipreciosas, como o cobiçado lápis-lazúli e as vibrantes esmeraldas.57
Essa vasta riqueza mineral representa um potencial econômico considerável para o Afeganistão, embora sua exploração tenha sido historicamente dificultada pela instabilidade política, conflitos e falta de infraestrutura adequada.79 Em um contexto global de crescente demanda por minerais críticos, essenciais para as tecnologias modernas e a transição para energias renováveis, o Afeganistão se encontra em uma posição geopolítica relevante, com o potencial de desempenhar um papel importante no cenário global de recursos naturais.79
Demografia: A População Afegã
A população do Afeganistão em 2024 é estimada entre 42.6 milhões e 43.4 milhões de habitantes.86 As projeções populacionais indicam um aumento para aproximadamente 43.8 milhões em 2025.86 O país apresenta uma taxa de crescimento populacional significativa, estimada em cerca de 2.7% a 2.8% ao ano.86 Este rápido crescimento populacional pode exercer pressão considerável sobre os recursos naturais, a infraestrutura e a capacidade do governo de fornecer serviços básicos à sua população.
O Afeganistão é caracterizado por uma rica composição étnica e linguística, refletindo sua história como um ponto de encontro entre diversas culturas e impérios.3 Os principais grupos étnicos incluem os Pashtuns, que constituem a maioria da população (estimada entre 42% e 55%), seguidos pelos Tajiques (aproximadamente 25% a 32%), Hazaras (cerca de 3% a 18%), Uzbeks (em torno de 7% a 9%) e Turcomanos (aproximadamente 2% a 3%).3 Além desses grupos principais, existem várias minorias étnicas menores, como Aimaqs, Balochis, Nuristanis e Pashayis.91
Essa diversidade étnica é uma característica fundamental da sociedade afegã, moldando sua história, cultura e dinâmica política.76 A distribuição desses grupos étnicos não é homogênea em todo o país, com diferentes grupos tradicionalmente concentrados em regiões específicas.76
Grupo Étnico | Estimativa Populacional (%) |
Pashtun | 42 – 55 |
Tajique | 25 – 32 |
Hazara | 3 – 18 |
Uzbek | 7 – 9 |
Turcomano | 2 – 3 |
Outros | 3 – 8 |
Fonte: | 3 |
O Afeganistão possui duas línguas oficiais: o Dari (também conhecido como persa afegão) e o Pashto.3 O Dari é falado por uma porcentagem maior da população como primeira ou segunda língua, estimada em cerca de 77%, enquanto o Pashto é falado por aproximadamente 48%.102 Além das línguas oficiais, existem várias outras línguas regionais importantes faladas por minorias étnicas em todo o país, incluindo Uzbeki, Turcomano, Balochi, Pashayi e Nuristani.102
O Dari desempenha um papel crucial como língua franca, facilitando a comunicação entre diferentes grupos étnicos em todo o Afeganistão.94 Essa diversidade linguística reflete a complexa composição étnica e a longa história de interações culturais na região.101
O Islã é a religião predominante no Afeganistão, com mais de 99% da população se identificando como muçulmana.3 A maioria dos muçulmanos afegãos são sunitas, representando entre 85% e 90% da população. Uma minoria significativa, estimada entre 7% e 20%, segue o Islã xiita, sendo a maioria pertencente à etnia Hazara.3
O Islã desempenha um papel central na sociedade, na cultura e na política do Afeganistão, influenciando as normas sociais, os costumes e as instituições do país.31 Historicamente, embora sunitas e xiitas tenham coexistido no Afeganistão, a divisão sectária tem sido ocasionalmente explorada em conflitos políticos e étnicos.76
A densidade populacional do Afeganistão é relativamente baixa, estimada em cerca de 63 a 67 pessoas por quilômetro quadrado.3 A maior parte da população reside em áreas rurais, com cerca de 73% a 74% dos afegãos vivendo fora dos centros urbanos.86 Essa baixa densidade populacional e a predominância da vida rural têm implicações significativas para a economia do país, o acesso a serviços e a infraestrutura, que muitas vezes são limitados em áreas remotas.
Cultura e Sociedade: A Alma do Afeganistão
A sociedade afegã é rica em valores sociais e tradições profundamente enraizadas, com forte ênfase na hospitalidade (melmastia), na honra (nang e pat) e na lealdade (wafa) como pilares fundamentais da estrutura social.118 A honra familiar (namus) é considerada de extrema importância, influenciando muitos aspectos da vida social e das relações interpessoais.123 Esses valores tradicionais moldam as interações sociais, o comportamento individual e a conduta comunitária em todo o Afeganistão.
Um código de conduta particularmente influente na sociedade afegã é o Pashtunwali, o estilo de vida tradicional e o código de honra do povo Pashtun.123 Este código não escrito abrange uma série de princípios, incluindo hospitalidade, asilo (nanawatai) e justiça/vingança (badal).123
Embora seja originário do povo Pashtun, o Pashtunwali exerce uma influência significativa na cultura e nas normas sociais em todo o Afeganistão, mesmo entre outros grupos étnicos.123 Em áreas onde a autoridade do governo central é fraca, o Pashtunwali muitas vezes serve como um sistema protolegal para a resolução de disputas e a manutenção da ordem social.131
As principais etnias do Afeganistão possuem aspectos culturais distintos que enriquecem a diversidade do país:
- Os Hazara são conhecidos por suas tradições musicais e literárias únicas, bem como pelo esporte tradicional do Buzkashi.133 Historicamente, eles estavam envolvidos principalmente na agricultura de subsistência e no artesanato.
- Os Tajiques possuem uma cultura predominantemente persa, com fortes elementos de outras culturas da Ásia Central e uma profunda influência islâmica.91 Tradicionalmente, eles eram um povo sedentário envolvido na agricultura.
- Os Uzbeks mantêm identidades tribais fortes que influenciam significativamente suas estruturas sociais e políticas.142 Eles tiveram uma influência notável na cultura afegã, particularmente através do esporte e da música. Tradicionalmente, os Uzbeks eram agricultores e também eram conhecidos por sua produção de tapetes.
Cada um desses grupos étnicos, juntamente com outros, contribui para a rica tapeçaria cultural do Afeganistão, mantendo tradições e costumes distintos que enriquecem a identidade nacional.
A história da arte afegã abrange muitos séculos, exibindo influências de diversas civilizações, incluindo persas, indianas e chinesas.6 Um período particularmente significativo foi a era greco-budista, especialmente o florescimento da arte de Gandhara, que combinou elementos da arte grega e budista.6 Após a conquista islâmica do Afeganistão, a arte islâmica floresceu, com artistas afegãos adaptando materiais locais, como o precioso lápis-lazúli, para uso em suas criações.148
Desde o século XX, a arte afegã também começou a incorporar técnicas ocidentais, demonstrando a contínua evolução das expressões artísticas no país.148 A localização estratégica do Afeganistão como um ponto de encontro de culturas ao longo da história se reflete claramente em sua diversificada e rica história da arte.
A música e a poesia ocupam um lugar de destaque na cultura afegã. O folclore e as lendas são transmitidos há séculos através de canções e narrativas orais, mantendo viva a rica herança cultural do país.36 O Afeganistão possui uma tradição literária diversificada, com obras escritas em Dari, Pashto, Turco e Árabe ao longo de sua história.36
A música afegã é influenciada pelas tradições clássicas da Índia, Pérsia e Paquistão, refletindo as conexões culturais históricas da região.151 Instrumentos tradicionais como o rubab, a dombura e o ghichak desempenham um papel central na música afegã.151 Música e poesia são, portanto, formas essenciais de expressão cultural, transmissão de história e preservação dos valores e da identidade afegã.129
A culinária tradicional afegã é halal e reflete as influências das cozinhas persa, da Ásia Central e do Sul, devido à localização geográfica e aos laços culturais do país.118 Pratos à base de arroz e várias formas de naan (pão achatado) são alimentos básicos na dieta afegã.157
O chá é uma parte significativa da vida cotidiana e um símbolo de hospitalidade, sendo consumido em grandes quantidades e oferecido a todos os hóspedes.126 A culinária afegã, com sua diversidade de pratos e ingredientes, reflete a rica tapeçaria étnica e geográfica do país.
Décadas de conflito tiveram um impacto devastador não apenas na vida das pessoas, mas também na cultura e no patrimônio do Afeganistão. Pilhagens e destruição de sítios históricos e artefatos culturais resultaram em perdas irreparáveis.158
A destruição dos Budas de Bamiyan pelo Talibã em 2001 é um exemplo trágico da perda do patrimônio cultural em meio ao conflito.6 O conflito contínuo não apenas causou imensa perda de vidas e deslocamento, mas também resultou na destruição irreparável de uma parte significativa da rica herança cultural afegã.
Economia: Desafios e Potencial
Tradicionalmente, a agricultura e a pecuária constituíram a base da economia afegã, contribuindo significativamente para o Produto Interno Bruto (PIB) do país.162 O setor de serviços também desempenha um papel importante na economia.167 Além disso, o Afeganistão possui vastos recursos minerais inexplorados, representando um potencial econômico significativo para o futuro.78 A economia afegã, portanto, apresenta uma base diversificada, embora historicamente tenha sido fortemente dependente da agricultura.
Apesar de sua riqueza mineral potencial, o Afeganistão continua sendo um dos países menos desenvolvidos do mundo, enfrentando desafios econômicos persistentes, como altas taxas de pobreza e desemprego, além de uma forte dependência da ajuda externa.166 A instabilidade política e o conflito contínuo no país têm impedido o desenvolvimento econômico sustentável e a exploração eficaz de seus recursos.
A ajuda internacional tem desempenhado um papel crucial na economia do Afeganistão, especialmente no financiamento do governo e na prestação de serviços básicos à população antes da tomada do poder pelo Talibã em agosto de 2021.174
No entanto, após esse evento, a ajuda internacional foi drasticamente reduzida, levando a uma crise econômica significativa e agravando a situação humanitária no país.171 A ajuda humanitária continua sendo vital para evitar um colapso econômico ainda maior e para atender às necessidades básicas de milhões de afegãos.171 A forte dependência da ajuda externa torna a economia afegã particularmente vulnerável a mudanças políticas e nas prioridades dos países doadores.
O Produto Interno Bruto (PIB) nominal do Afeganistão em 2023 foi estimado em cerca de US$ 17.2 bilhões.168 O PIB per capita permanece baixo, situando-se entre US$ 380 e US$ 460.168 Após uma forte contração econômica em 2021, a economia afegã mostrou sinais de crescimento modesto em 2023 e 2024.171 No entanto, essa recuperação permanece frágil e enfrenta desafios consideráveis para se sustentar a longo prazo.
A balança comercial do Afeganistão apresenta um déficit significativo, com as importações superando substancialmente as exportações.172 As principais exportações do país incluem produtos agrícolas como frutas e nozes, além de tapetes, lã e pedras preciosas.59 Por outro lado, as importações consistem principalmente em máquinas, alimentos, têxteis e produtos petrolíferos.168 A alta dependência de importações torna o Afeganistão vulnerável a choques econômicos externos e flutuações nos preços globais de commodities.
A tomada do poder pelo Talibã em agosto de 2021 teve consequências econômicas significativas para o Afeganistão, levando a uma forte contração da economia.171 A ajuda internacional, que era uma fonte crucial de financiamento para o governo afegão, foi amplamente suspensa, e os ativos do banco central afegão foram congelados em contas no exterior.171
O setor bancário do país também foi severamente afetado pela instabilidade e pelas sanções internacionais.171 A economia afegã, portanto, enfrenta desafios consideráveis sob o regime do Talibã, incluindo isolamento financeiro, incerteza política e uma crise humanitária em curso.
Produtos de Exportação | Produtos de Importação | Principais Parceiros Comerciais |
Frutas e Nozes | Farinhas de Trigo | Paquistão |
Tapetes | Tabaco Enrolado | Índia |
Lã | Óleo de Palma | China |
Algodão | Equipamento de Radiodifusão | Emirados Árabes Unidos |
Pedras Preciosas | Arroz | Irã |
Fonte: | 59 | 168 |
O Cenário Político Atual
Atualmente, o Afeganistão é governado pelo Talibã sob a forma de um emirado islâmico unitário e totalitário.3 A lei islâmica (Sharia), especificamente a jurisprudência Hanafi sunita, serve como a base fundamental do sistema legal do país.31 Esta forma de governo representa uma mudança drástica em relação à república islâmica que existia anteriormente no Afeganistão.
Sob o domínio do Talibã, não há partidos políticos formais operando no Afeganistão. A estrutura de poder está centrada na liderança do Talibã e em sua interpretação da lei islâmica, com pouca ou nenhuma participação de outras facções políticas ou da sociedade civil na tomada de decisões.
As relações internacionais do Afeganistão sob o Talibã são complexas e marcadas por um reconhecimento limitado por parte da comunidade internacional. Nenhum país reconheceu formalmente o governo do Talibã desde sua retomada do poder em agosto de 2021.47
No entanto, alguns países, principalmente vizinhos regionais, estabeleceram laços diplomáticos de facto com o regime.83 As relações com países vizinhos, como o Paquistão, têm sido particularmente tensas devido a questões de segurança de fronteira e alegações de apoio a grupos militantes.177
A falta de reconhecimento internacional dificulta significativamente a capacidade do Talibã de obter ajuda econômica e investimentos externos, essenciais para a estabilização e o desenvolvimento do Afeganistão.
O governo do Talibã enfrenta uma série de desafios internos e externos. Internamente, há preocupações significativas em relação à imposição de sua interpretação estrita da lei islâmica, particularmente no que diz respeito aos direitos das mulheres e das minorias étnicas e religiosas.47
Grupos não pashtuns também se sentem marginalizados e sub-representados na estrutura de poder do Talibã.76 Externamente, o regime enfrenta sanções financeiras e o congelamento de ativos afegãos mantidos no exterior, o que agrava a já precária situação econômica do país.171 O governo do Talibã, portanto, enfrenta desafios consideráveis para obter legitimidade internacional e estabelecer uma estabilidade duradoura no Afeganistão.
Conclusão
A história do Afeganistão é uma tapeçaria complexa e multifacetada, tecida com fios de antigas civilizações, impérios conquistadores e uma resiliência inabalável diante de inúmeros desafios. Desde suas raízes pré-históricas e seu papel como um centro vital na Rota da Seda, o Afeganistão tem sido um ponto de encontro de culturas e um campo de batalha para impérios.
A chegada do Islã transformou sua paisagem religiosa e cultural, dando origem a poderosas dinastias medievais. A era moderna viu o Afeganistão emergir como um estado-nação, apenas para ser envolvido nas maquinações do “Grande Jogo” e nas consequências devastadoras da Guerra Fria e da subsequente ascensão do Talibã.
Sua localização geográfica estratégica continua a ser um fator definidor, tornando-o um ator crucial na dinâmica regional da Ásia Central e do Sul. A rica diversidade étnica e linguística do Afeganistão, juntamente com seus valores culturais profundamente enraizados, moldaram uma identidade nacional única, embora muitas vezes fragmentada por lealdades tribais e regionais.
A economia do país, apesar de seu potencial em recursos naturais, permanece assolada pela pobreza, pelo desemprego e pela dependência da ajuda externa, especialmente após a recente tomada do poder pelo Talibã.
O cenário político atual é incerto, com o Talibã no controle e enfrentando desafios significativos tanto internamente quanto em suas relações com a comunidade internacional. A falta de reconhecimento formal e as preocupações com os direitos humanos continuam a ser grandes obstáculos.
Compreender a intrincada história do Afeganistão e os desafios contemporâneos é essencial para a comunidade internacional, pois o futuro do país terá implicações significativas para a estabilidade regional e global.